sábado, 26 de abril de 2014

ENTREVISTA: PSICÓLOGA FALA SOBRE MORTE E LUTO
























A perda de uma pessoa querida é uma das situações mais difíceis que a vida pode trazer. Na entrevista abaixo, a psicóloga Clarissa De Franco ensina como é possível superar o luto por quem se ama, explica por que a morte é um assunto tabu e ainda afirma que a falta de rituais depois da perda pode deixar as pessoas próximas sem referências.

QUAL A IMPORTÂNCIA DE UMA PESSOA VIVER O LUTO PELA PERDA DE ALGUÉM QUERIDO?

Clarissa De Franco: Ter espaço para o luto na vida social, familiar, profissional e em outros campos é mais que um direito de quem perde alguém, é um dever humano que temos uns com os outros. O processo de luto é necessário para a reconstrução do lugar do sujeito que perde alguém. E como todos lidarão com perdas um dia, é importante que se construa um espaço coletivo que legitime o luto como um recurso de saúde não só para o enlutado, mas também para a sociedade. O processo de luto devolve ao enlutado a chance de uma nova história.

NO PROCESSO DE LUTO, BUSCAR APOIO DAS OUTRAS PESSOAS AJUDA A SUPERAR A DOR?

Clarissa De Franco: O luto é essencialmente um processo solitário, assim como é vivenciar qualquer dor. Na verdade, podemos e devemos partilhar sentimentos e pensamentos, mas existe algo muito particular no modo como cada um vive esse momento. Essas circunstâncias de isolamento podem ser realmente necessárias, já que são possibilidades da pessoa entrar em contato com seus sentimentos. Entretanto, estes momentos devem ser alternados com horas de partilha, até para que a pessoa em luto não perca a referência sobre quem ela é. O luto pode ser tão violento que podem existir momentos de despersonalização, beirando à loucura. E a família e os amigos, por exemplo, trazem referências, ligando a pessoa ao seu mundo e à sua identidade. É importante reconhecer-se no outro, mesmo que só por um instante.
Para trazer conforto a quem sofreu uma perda muito grande, estar perto já é algo importante, respeitando também os momentos em que a pessoa quer estar sozinha. Além disso, são bacanas pequenos gestos de carinho, alguns convites que lembrem a pessoa que ela tem possibilidades de vida a seu dispor.

ALGUMAS TEORIAS ASSEGURAM QUE O LUTO POSSUI CINCO FASES. QUAIS SÃO ELAS E QUE TIPO DE APRENDIZADO EXISTE EM CADA UMA?

Clarissa De Franco: A teoria mais conhecida é de Elizabeth Kubler Ross, que postulou o luto em cinco fases, que não necessariamente ocorrem em sequência. Basicamente essas etapas seriam: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Elas indicam uma evolução da maturidade de lidar com a morte. Além disso, é importante dizer que o luto é como se fosse uma existência à parte: quando a vida de todos à volta parece continuar, a do enlutado parece estar em outra frequência, como se fosse uma vida paralela. Essas etapas podem ocorrer também diante de outras perdas e frustrações graves, como no divórcio ou em pacientes terminais. Elizabeth Kubler Ross explica os estágios de luto da seguinte forma:
  • 1Negar é usar recursos para afastar a realidade que dói. Agir como se nada tivesse acontecido e agarrar-se demais ao trabalho são comportamentos frequentes. O sentimento de vazio e isolamento é comum nesse período.
  • 2No segundo estágio, da raiva, é comum procurar um responsável pela dor e não aceitar a impotência diante da morte. Ocorre a oscilação entre os sentimentos de raiva e culpa. Ou seja, ora a energia da dor é dirigida a um objeto de fora (raiva do médico, do hospital, de alguém que esteja envolvido na morte), e em outros a responsabilidade da dor é autodirigida ("se eu tivesse chegado mais cedo", "eu deveria ter percebido os sinais"), trazendo culpa. A raiva, nesse caso, pode aparecer de forma extrema, com acessos de ira, violência, sarcasmo, agressividade ou amargura.
  • 3O terceiro estágio, de barganha, é frequente em processos de doenças terminais, quando a pessoa tenta "barganhar" algo para não perder a vida. Barganhar é tentar negociar com o destino, é ainda achar que ele pode ou poderia ter sido alterado pelo enlutado. É não abrir mão do controle, assim como nas fases anteriores.
  • 4A depressão é o último estágio antes da aceitação. Quem se deprime sai da condição de controlador do destino e passa a reconhecer as limitações humanas. A tristeza, a desesperança, a perda de sentido e a amargura frequentemente acompanham este momento. Se a pessoa passa a ter alterações de sono e apetite, se não encontra mais motivações para fazer nenhuma atividade, se chora muito ou permanece apática, se fica amargura e possui pensamentos negativos que não consegue controlar, enfim... O enlutado que estiver em sofrimento pode contar com algum profissional desde o início do luto. Entretanto, se os sintomas permanecerem ou se intensificarem após seis meses da morte, é fundamental esse acompanhamento.
  • 5A aceitação é o processo que nos torna capazes de ver, tocar, falar sobre a morte e, ao mesmo tempo, deixá-la ir para onde tiver que ir. Aceitar não é não sentir dor ou esquecer a morte, mas é modificar o espaço da dor dentro da pessoa. Ela passa a ser capaz de se lembrar de quem partiu sem amargura, ressaltando os aspectos positivos da relação vivida.

EM SUA OPINIÃO, POR QUE A MORTE É CONSIDERADA UM ASSUNTO TABU, CAPAZ DE ASSUSTAR MUITAS PESSOAS?

Clarissa De Franco: A morte é um tabu porque ela é o maior limite humano. Um psicólogo estudioso do tema, chamado Ernest Becker, afirmou que o ser humano possui uma necessidade vital de ser grandioso. Cada ser humano quer ser notado e reconhecido à sua maneira, e nesse sentido a finitude da vida é inaceitável. Por isso, criamos constantemente estratégias de burlar a morte. A juventude e a beleza são valorizadas como ideais de uma sociedade que não se aceita finita. O aumento da expectativa de vida e os avanços na medicina nos fazem crer que sempre teremos recursos para postergar a morte. Além disso, a separação da Igreja e do Estado e a perda do espaço da religião nas esferas públicas faz com que o luto seja empobrecido simbolicamente. Não sabemos o que fazer com a morte. Os rituais de morte tendem a ser rápidos e privativos, e poucas pessoas sabem o que dizer diante de alguém que sofre uma perda. A verdade é que falta uma educação para lidar com a morte, uma vez que ela faz parte da vida."Os rituais de morte tendem a ser rápidos e privativos, e poucas pessoas sabem o que dizer diante de alguém que sofre uma perda. A verdade é que falta uma educação para lidar com a morte, uma vez que ela faz parte da vida."

QUAIS TIPOS DE DANOS A PERDA DE UMA PESSOA AMADA PODE CAUSAR?

Clarissa De Franco: Todo sofrimento pode levar a distúrbios psicológicos. Os casos mais comuns são transtornos de ansiedade (síndrome do pânico e transtorno obsessivo-compulsivo), transtornos de humor (depressão e transtorno bipolar) e alguns de ordem cognitiva (lapsos de memória e dificuldade de concentração). Também podem surgir sintomas psicóticos (delírios e alucinações), além de outros de ordem psicossomática (paralisias corporais sem motivos físicos, alterações metabólicas - como distúrbios menstruais e hormonais - e alteração do apetite e do sono).
Como se vê, as perdas de alguém podem acarretar vários tipos de distúrbios e isso deve ser observado pelos familiares e amigos do enlutado. Um processo adequado de luto varia de 6 meses a 2 anos, entretanto a partir do sexto mês já é possível verificar se existem sintomas de depressão. Se possível, os processos de luto devem ser acompanhados por profissionais da saúde.

NO CASO DE MORTES SÚBITAS, O PROCESSO DE LUTO É DIFERENTE?

Clarissa De Franco: Geralmente mortes repentinas, violentas, inesperadas ou de pessoas jovens podem provocar o chamado "transtorno do estresse pós-traumático" - o mesmo que pode ocorrer diante de assaltos ou exposição às situações agudas de estresse. Este transtorno traz medo extremo, angústia e reclusão, além de pensamentos negativos que acabam por evitar situações sociais em que a pessoa poderia estar vulnerável ou exposta à mesma violência sofrida. A pessoa acredita claramente que tudo vai ocorrer da pior maneira possível e prefere ficar em casa. Sensações físicas, como calafrios, palpitação e tontura podem ocorrer. Para lidar com este tipo de situação, o enlutado deve buscar ajuda médica e psicológica. Além disso, manter a prática de exercícios físicos também contribui para o tratamento.

QUANDO A FAMÍLIA PERDE ALGUÉM POR CONTA DE ATOS INCONSEQUENTES DE OUTRA PESSOA - COMO EM ACIDENTES E ASSASSINATOS - O SENTIMENTO DA RAIVA COSTUMA FICAR EVIDENTE. COMO SUPERAR ISSO?

Clarissa De Franco: A raiva é certamente um dos sintomas centrais deste tipo de luto. E não é preciso negar esse sentimento, pelo contrário. O enlutado precisa de espaço para sentir raiva, sem que as pessoas de fora olhem para ele como se estivesse louco. Porém, a raiva precisa ser manifestada em um espaço adequado, como o terapêutico, pois é tentador acreditar que, ao canalizar toda a raiva sobre a figura do suposto "culpado", a dor passará. Mas isso não acontece. Em casos de mortes violentas, como acidentes e assassinatos, o ideal é que os enlutados passem por acompanhamento psicológico ou psiquiátrico.

DIZEM QUE QUANDO UMA PESSOA MORRE DEPOIS DE PASSAR MUITO TEMPO ENFERMA, A FAMÍLIA VIVE O LUTO AOS POUCOS. ISSO É VERDADE?

Clarissa De Franco: Considero este luto crônico um dos mais nocivos para a saúde dos enlutados. Ele vai aos poucos "roubando" a energia e a esperança das pessoas envolvidas. O sentimento que se exalta neste tipo de luto é o de impotência e de que as tentativas realizadas antes do desfecho da morte foram vãs. Ao final do processo, existem as sensações de impotência e alívio, ao mesmo tempo em que o enlutado pode sentir culpa pelo alívio experimentado.

PESSOAS QUE TIVERAM PERDAS NA FAMÍLIA DIZEM QUE A SAUDADE DIMINUI, MAS NUNCA PASSA. VOCÊ ACREDITA NESSA AFIRMAÇÃO?

Clarissa De Franco: A saudade não passa, mas sua representação se transforma. Isso quer dizer que no início, diante do impacto da perda, a saudade dói constantemente. Esta dor vai sendo redimensionada e aos poucos a saudade pode ocupar um lugar diferente. O aperto no peito, a angústia e o vazio podem ser substituídos por lembranças que oscilam entre o sentimento de falta e o carinho pela pessoa que se foi.
O ENTERRO DE UMA PESSOA COSTUMA SER DOLOROSO PARA OS QUE FICAM. É NECESSÁRIO PASSAR POR ESSE RITUAL?
Clarissa De Franco: Os rituais de morte são muito importantes para a elaboração do luto. Eles são elementos de despedida que conferem respeito e dignidade à memória do morto. Uma das dificuldades encontradas na atualidade é justamente o empobrecimento dos processos rituais de morte. Isso deixa as pessoas próximas sem referências, ninguém sabe o que fazer e dizer diante da morte. Falta uma espécie de educação para lidar com este momento.

SENDO ASSIM, QUAIS DICAS DE RITUAIS OU AÇÕES VOCÊ DARIA PARA ALIVIAR A DOR DA PERDA DE ALGUÉM QUERIDO?

Clarissa De Franco: Escrever uma carta para a pessoa que morreu, dizendo tudo o que gostaria de ter dito e se despedindo, pode ajudar. Além disso, é bom também procurar lembrar-se do sorriso ou de alguma característica positiva da pessoa e recorrer a essa imagem sempre que estiver mal. Agradecer pelo tempo que passaram juntos e oferecer alguma coisa que foi produzido para essa pessoa, como um desenho ou um poema, também podem ajudar.

E O QUE FAZER COM OBJETOS QUE REMETEM À LEMBRANÇA DA PESSOA QUE SE FOI? É SAUDÁVEL MANTÊ-LOS PRÓXIMOS DE QUEM ESTÁ SOFRENDO PELA PERDA?

Clarissa De Franco: Os objetos fazem parte da memória e, claro, nos ligam ao morto. Por isso, cada um tem seu tempo para fazer uma "despedida" e aceitar que aqueles objetos não precisam mais ocupar lugar para substituir a pessoa que se foi, ou para que ninguém se esqueça de quem foi aquela pessoa. Esta é a verdadeira morte, a morte da consciência e da memória e, por isso, muitos se apegam aos objetos do falecido como forma de manter a memória da pessoa viva. Mas é importante ter um momento de despedida, uma espécie de ritual para tirar da casa os objetos que não são mais utilizados. Ficar com um amuleto que remete à pessoa que se foi pode ser uma alternativa, mas um quarto inteiro sem ser mexido depois de um tempo passa a não ser mais saudável.

ÀS VEZES, MESMO COM O APOIO DA FAMÍLIA E AMIGOS, UMA PESSOA NÃO CONSEGUE SUPERAR UMA GRANDE PERDA. O QUE FAZER NESSES CASOS?

Clarissa De Franco: Os recursos são desde procurar ajuda médica e psicológica, até a busca de atividades que tragam um novo sentido para a vida, como grupos de apoio, esportes, religiões, filosofias de vida, cursos, mudança de casa, viagem, etc. A ideia é reconstruir um sentido.

O QUE UMA PESSOA QUE ESTÁ VIVENDO O LUTO PODE TRAZER DE BOM DE UMA TRAGÉDIA?

Clarissa De Franco: Transformar o sofrimento em boas ações é um dos caminhos de elaboração do luto, que pode ter impacto positivo na vida do enlutado e na sociedade também. Alguém que sofre uma perda por acidente, por exemplo, pode se engajar em campanhas de conscientização para evitar situações-problema no trânsito. A ideia é fazer da dor uma possibilidade de aprendizado e de reconstrução. Acredito que não há medicamento mais poderoso para a dor, que a ajuda ao próximo e o compartilhamento dos aprendizados.

PRATICANDO O DESAPEGO


Exergue os términos com outros olhos e aprenda a dizer adeus
 
Em 2009, a entrega do Oscar de melhor filme estrangeiro trouxe uma surpresa. O filme japonês Partidas (Departures /Okuribito) levou a tão desejada estatueta no lugar de outros filmes mais incensados pela crítica. Mas afinal de contas, o que Partidas tem que o torna tão especial? Trata-se da história de um homem na faixa dos 20 anos, casado, que toca violoncelo numa orquestra em Tóquio, e esta é dissolvida pelo patrocinador. Ele volta à sua cidade natal com a sua mulher e consegue um emprego no qual ganha muito bem. O que o desagrada é o novo trabalho em si: arrumar defuntos para serem cremados, numa cerimônia em que a família da pessoa morta está presente. À medida em que ele persiste no emprego, começa a perceber a importância do que faz e a dignidade de honrar os mortos em sua despedida.
Um outro filme, este feito para a TV, pela HBO, chamado Correr Riscos (Taking Chance) mostra um coronel que escolta o corpo de um soldado morto na guerra do Iraque para ser entregue a seus pais no interior, e também fala de despedir-se com dignidade.
A morte faz parte da vida, mas muitas vezes a negamos, talvez pelo medo, talvez por estarmos ocupados demais tentando sobreviver. Quando entendemos a morte como a outra face da vida, esta toma um novo sentido. Podemos efetivamente viver - e não somente sobreviver. Geralmente a morte, principalmente de pessoas queridas, nos sacode de nossa zona de conforto, de uma forma mais ou menos intensa, provocando questionamentos sobre a vida, principalmente sobre aquelas questões que adiamos a resolução. A morte nos lembra que tudo passa, que nada é para sempre, e dá uma noção real de que o tempo anda, e não espera.
É preciso saber dizer adeus a quem nos deixa, mesmo sabendo que o que está presente naquele instante é um corpo sem vida. Isso realça a dignidade da vida, não só daquele que morreu, mas de quem ainda vive.
Dizer que a morte faz parte da vida nos faz pensar só no final, mas é muito mais presente do que isso: a cada situação em que precisamos terminar algo para começar uma nova etapa da vida, a morte está ali. Na Índia, a religião hindu tem uma trindade de deuses, formada por Brahma, Shiva e Vishnu. Brahma é o criador de tudo, Shiva é o destruidor e Vishnu o preservador. Parece meio sinistro um deus que destrói, mas é através da destruição do que está gasto que há renovação, que é possível nascer o novo. Não à toa, Shiva é o deus mais adorado na Índia, tendo muito mais templos onde é cultuado, do que os outros deuses da trindade hindu.
Pode parecer absurdo o que eu vou dizer, mas integre a morte em sua vida para que você possa viver mais plenamente. Busque soluções para aqueles problemas que vem adiando, como se o tempo não passasse. Perceba o que já terminou em sua vida, e você não reconhece. Muitas vezes nos apegamos a situações que já não fazem mais sentido, somente pela rotina."Muitas vezes nos apegamos a situações que já não fazem mais sentido, somente pela rotina."
Podem ser situações de trabalho, de relacionamento, de hábitos. Viver tendo presente a perspectiva de que morreremos não deveria trazer medo, mas acentuar a responsabilidade que temos de fazer com que a nossa vida tenha o rumo que planejamos para ela. Assim, podemos ser dignos de um dia morrer conscientes de que buscamos (mas nem sempre conseguimos) realizar aquilo que é necessário da melhor forma possível.

O que o luto pode nos ensinar


O que o luto pode nos ensinar 


:: Bel Cesar ::
Aprendendo a conviver com a perda

Sensação de estar caindo no vácuo: um espaço vazio, desconhecido e silencioso.
São sentimentos que surgem quando recebemos a notícia do falecimento de uma pessoa importante em nossa vida. Nosso corpo sente-se como se tivesse também tido uma falência. Não entendemos ao certo o que estamos sentindo, ficamos atordoados, fora do tempo. Sabemos apenas que algo grave e denso ocorreu.

À medida que nos recuperamos deste choque inicial, enfrentamos a realidade da perda: o que e onde mudou. A ausência da pessoa que se foi evidencia como estávamos nos apoiando nela em certos aspectos de nossa vida. O luto torna-se, então, um período de conscientização da necessidade de recuperarmos nossa própria capacidade de auto-sustentação. Em algumas áreas de nossa vida, será a primeira vez que estaremos aprendendo a ser autônomos!

Sentimo-nos como um jogo de quebra-cabeças que foi desmontado e remexido. Ao tentarmos unir as peças que estavam separadas umas das outras é que nos damos conta que elas já estavam distantes entre si há muito tempo, muito antes do falecimento da pessoa que despertou o processo de querer juntá-las. A ausência daquele que se foi evidencia onde e como estávamos rompidos, distantes de nós mesmos. Logo, é hora de perceber nosso verdadeiro tamanho sem a presença e a dinâmica dessa pessoa que preenchia tantas lacunas em nosso processo de autoconhecimento.

O luto é um tempo de reconstrução de nossa auto-imagem. Na fragilidade da dor da perda, desvendamos camadas mais profundas de nosso interior; é lá encontramos feridas não curadas. Durante o luto, nossos usuais mecanismos de defesa frente à dor falham. Já que não é possível evitar a dor, temos de aprender a enfrentá-la. É hora de nos perguntarmos: Do que nossa dor realmente se lamenta? Há quanto tempo essa dor pede para ser vista e tratada?

Mesmo sem ter a resposta, nossa consciência nos pressiona a fazer algo para sair de onde estamos atolados. Alessandra Kennedy escreve em seu livroO pesar revolve os mais profundos níveis da psique trazendo à tona questões não resolvidas, que silenciosamente sabotam a nossa vida. Os sonhos nos informam sobre a presença dessas questões e fornecem orientação de como resolvê-las. Quando ignorados, podem se repetir ou surgir de forma mais dramática, talvez transformando-se em pesadelos.

Não fomos educados para lidar com a dor da perda. Instintivamente, aprendemos a conter nosso amor na tentativa de nos protegermos contra a dor dessa realidade: de que um dia iremos nos separar daqueles com quem convivemos tão de perto. Na economia do amor só há perdas. O luto nos ensina a despertar o amor por nós mesmos, e desta forma ampliamos nossa abertura com os outros. Caem as resistências, pois passamos a lidar com a vulnerabilidade da vida. O luto nos ensina que, pelo resto de nossas vidas, teremos que aprender a aceitar a inevitabilidade de nossa própria mortalidade.

Um novo olhar de auto-reconhecimento começa a surgir quando passamos a acolher, com afeto e tempo, a fragilidade diante da dor da perda. As questões inacabadas vêm à tona: tudo que ficou por ser dito, escutado, feito e compartilhado. Revemos todas as áreas de nossa vida: afetiva, financeira, profissional e espiritual. Surge a coragem, gerada pelo desejo sincero de mudar o que for preciso mudar.

Durante o processo de luto, nos damos conta, também, das falsas expectativas que tínhamos em relação àquele que faleceu. Se elas não se realizaram em vida, agora é a hora de aceitar nossa decepção, pois não há mais como remediá-las. Chegou o momento de agradecer por tudo que recebemos e de aceitar o que não pudemos receber. A partir daí, surge em nós um processo profundo de reavaliação de nossas expectativas atuais. É tempo de nos darmos uma nova chance, real e possível.

O luto é um processo que foge ao nosso controle e por isso pode durar muito mais tempo do que imaginamos que possa durar. Mesmo depois de nos recuperarmos, ainda iremos, inesperadamente, nos encontrar em situações que fazem com que sintamos que caímos outra vez no vácuo da perda. Cada vez que nos erguermos, retornaremos mais inteiros. Como escreve Robin Robertson em seu livro:Não há mudança que não principie na escuridão da alma humana. Primeiro, temos de descobrir uma entrada para a escuridão, a seguir, temos de acender uma velinha no escuro para que possamos procurar nosso eu futuro e, por fim, temos de nos unir a ele. E isso requer determinação, paciência e, mais que tudo coragem.

Para finalizar, é bom lembrar que do mesmo modo que tivemos de aprender a nos permitirmos sentir a dor para superá-la, teremos que nos permitir sentir a alegria para celebrar o fato de estarmos vivos. Aqueles que se foram ensinam os que ficaram a viver melhor.

As exumações e translados de cadáveres e restos mortais no município do Rio de Janeiro


Felipe Ramos Campana
  
Resumo: O presente artigo tenta explicar as implicações jurídicas das exumações e translados na cidade do Rio de Janeiro, com base no Decreto Municipal que regula a matéria. Tenta, também, suprir a falta de doutrina sobre Direito Funerário no Brasil.
Sumário: 1. Introdução 2. Conceito de exumação 3.Conceito de transladação 4. Dos artigos do Decreto E 3707/1970 que regulam o tema e sua interpretação 5.Da natureza jurídica do cadáver, dos restos mortais e das cinzas cadavéricas
1. Introdução
A exumação e o translado de restos mortais são serviços funerários muito requeridos nos cemitérios, públicos e particulares, da cidade do Rio de Janeiro.
Ambos os serviços são regulados pelo Decreto “E” 3.707/1970 e tem suas tarifas descritas na Tabela da Secretaria Municipal de Obras da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.
2. Conceito de exumação
A exumação consiste em condicionar os restos mortais, após a decomposição natural dos tecidos, em uma caixa, geralmente de fibra.
As exumações podem ser requeridas administrativamente ou judicialmente, pelos herdeiros ou pelas autoridades.
Os corpos sepultados em sepulturas temporárias (catacumbas ou covas rasas), que tem o prazo de arrendamento de três anos, são exumados após o término do mesmo, sendo condicionados em caixas, cabendo aos herdeiros escolherem seu destino, (por meio da transladação) que é a cremação ou o sepultamento em uma sepultura perpétua.
Deve-se lembrar que se a família não se manifestar após o final do prazo de arrendamento, o Decreto E 3.707/1970 em seu artigo 125 diz que a administração do cemitério pode incinerá-los ou até mesmo doa-los para instituições e estabelecimentos científicos de ensino ou pesquisa, mediante convênios previamente aprovados pela Diretoria de Controle Funerário da Prefeitura (art. 125, parágrafo 2º).
Apesar do descrito em lei, não fica especificado no decreto se a administração do cemitério pode ou não efetuar tal incineração sem avisar a família ou o pagante do funeral, o que geram diversas ações judiciais em face dos cemitérios que efetuam tal exumação sem o dito aviso.
Entendo que analisando em conjunto os artigos 113, inciso II, alínea b, art. 115 e o artigo 123, artigo 125 do Decreto “E” 3.707/70, a concessionária dos cemitérios públicos pode e deve exumar e transladar os restos mortais inumados em sepultura temporária na qual os interessados não se manifestaram. Até porque os cemitérios públicos têm sua função social de sepultamentos para toda a população da cidade do Rio de Janeiro, não podendo ter suas sepulturas temporárias ocupadas por mero desinteresse dos herdeiros e/ou arrendatários.
Já os corpos sepultados em sepulturas perpétuas são exumados para que seja retomado o espaço dentro da sepultura perpétua, já que geralmente os carneiros perpétuos têm espaço para dois caixões e dez caixas de ossos (artigo 121 do Dec. E 3.707/70).
3.Conceito de transladação
O ato de translado consiste em remover o corpo cadavérico ou os restos mortais já exumados, de uma sepultura para outra (no mesmo ou em outro cemitério), para o Forno Crematório ou para uso das autoridades.
O cadáver, que é o corpo cadavérico antes da consumação dos tecidos, não pode ser transladado por requerimento administrativo dos interessados, apenas judicialmente ou a pedido da autoridade policial.
O Decreto E 3707/70 determina, no artigo 113, que nenhuma exumação poderá ser feita antes de decorridos três anos do sepultamento. Portanto, se for necessário translado do corpo cadavérico esse só se dará por decisão judicial, de autoridade policial ou do Ministério Público, geralmente para fins de investigação.
Quando se é necessário colher restos mortais para fins de exame de DNA, não é necessário que se proceda o translado do corpo para realizar tal exame, já que uma pequena parte do cadáver já pode indicar com precisão o resultado do teste.
Mas quando se é necessária uma autópsia, ou se tem dúvida da causa da morte, o corpo cadavérico pode ser removido para local específico por meio de determinação oriunda de autoridade.
Se o cadáver contiver moléstia grave, as autoridades judiciais, policiais ou administrativas podem proceder o traslado para cremar ou inumar o corpo em local seguro, evitando quaisquer danos a população, ou até mesmo não permitir que sejam feitas exumações de nenhuma natureza (artigo 120 do Decreto E 3.707/70).
4. Dos artigos do Decreto E 3707/1970 que regulam o tema e sua interpretação
Os dispositivos de lei que regulam os serviços são os artigos 113 ao 122 do Decreto E 3.707/1970.
O mais importante é o artigo 113 do referido Decreto, conforme transcrição abaixo:
 “Artigo 113 - Nenhuma exumação poderá ser feita, salvo:
I-se requisitada,por escrito e na forma da lei, por autoridade competente;
II-depois de decorridos três anos, prazo necessário à consumação do cadáver, desde que:
a)se trate de cadáver sepultado como indigente;
b)se trate de cadáver sepultado em sepultura arrendada, não renovado o arrendamento ou terminado o prazo máximo deste;   
c) a requerimento de pessoa habilitada em se tratando de cadáver sepultado em sepultura perpétua.”
Portanto, fica claro que as exumações não podem ser feitas antes do prazo de três anos. Tal prazo é o presumido para que o cadáver seja consumido atingindo o status de resto mortal.
O inciso primeiro indica que a exumação poderá ser requisitada pela autoridade competente, mesmo antes dos três anos indicados em lei, já que pode haver necessidade de analise de restos mortais ou cadáveres para fins inerentes ao Poder Público.
O artigo 114 tem relação direta com a alínea c do inciso II do artigo113, já que diz que as exumações de cadáveres e/ou restos mortais inumados em sepulturas perpétuas de qualquer espécie deverá ser feita por escrito pelo interessado, devendo este provar sua qualidade, a razão do pedido e a causada morte de todos que deseja exumar e/ou transladar. Caso o pedido seja de transladação do cadáver ou dos restos mortais para outro país, a autoridade policial ou autoridade competente deve obrigatoriamente consentir.
O artigo 115 deve ser analisado em conjunto com o artigo 113, II, alínea b, já que diz expressamente que as exumações relatadas no dispositivo indicado acima deverão ser feitas pela administração dos cemitérios caso os interessados não se manifestem após trinta dias do final do prazo de arrendamento de sepulturas temporárias (três anos).
O artigo 116 trata de uma ação preventiva, para evitar danos ao meio ambiente e a população, já que obriga que quando os translados de cadáveres forem entre cemitérios diferentes, os caixões deverão ser de madeira de lei, ajustado com parafusos e revestido inteiramente de lâminas de chumbo com dois milímetros de espessura perfeitamente soldadas, a fim de evitar vazamento de gases e líquidos tóxicos oriundos do cadáver.
O administrador do cemitério, ou até mesmo um preposto da empresa concessionária ou permissionária, deverá assistir a todas as exumações e translados para saber se foram satisfeitas todas as condições de lei (artigo 117).  
O administrador deve fornecer certidão de realização da exumação, sempre que requerida (artigo 118).
De acordo com o artigo 119 e parágrafos, as requisições de exumações e/ou translados de interesse da Justiça ou demais Órgãos Públicos, poderão ser feitas diretamente nos cemitérios, sem necessidade de protocolo administrativo na sede da concessionária ou permissionária, sempre por escrito.
5.Da natureza jurídica do cadáver, dos restos mortais e das cinzas cadavéricas
Deve-se ressaltar que a natureza jurídica, tanto do cadáver, tanto dos restos mortais é de bens fora do comércio. A doutrina penal, cível e administrativa, por muito tempo e por muitas vezes insistiu no fato de ambos terem sua natureza jurídica de coisa nula.
Atualmente, é facilmente perceptível que essa teoria não pode ser adotada. Com os avanços científicos, como por exemplo o exame de DNA, o cadáver e os restos mortais podem gerar provas num inquérito ou ação penal, ou até mesmo demonstrar uma paternidade ou parentesco em uma ação de alimentos ou em um Inventário. Então, a partir do momento que criam ou extinguem direitos, tais como gerar provas em um processo, não podem ser tratados como coisa nula.
Daí a conclusão de que tanto os restos mortais como os cadáveres tem natureza jurídica de bens fora do comércio pertencentes aos ascendentes, descendentes, cônjuge nos termos da Legislação Civil  em vigor.
Quanto às cinzas cadavéricas sua natureza jurídica pode variar. Para o Poder Público a natureza jurídica é de coisa nula, já que não cria nem extingue mais nenhum direito, tanto que as partes podem dispor delas como quiserem. Para a família as cinzas podem ser bens fora do comércio pelo seu valor sentimental.
 

Informações Sobre o Autor

Felipe Ramos Campana
Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes-Centro (Rio de Janeiro) Pós-graduado em Direito da Propriedade Intelectual pela PUC-Rio Advogado da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro

terça-feira, 15 de abril de 2014

Luto como processo natural da condição humana

A morte é a única certeza de nossas vidas, certeza esta que vem da constatação da finitude da vida. Na cultura Ocidental, a idéia de morte vem acompanhada de grande pesar, medos e angústias, aspectos estes que muitas vezes nos dificultam encará-la como um processo natural da condição humana.
Ao perdemos uma pessoa querida, por exemplo, além da angústia e tristeza que a saudade nos impõe, também nos sentimos ameaçados frente à sua morte dado que tal situação nos aproxima da nossa própria condição humana de vulnerabilidade, também permeada pela morte que fatalmente nos atingirá um dia.

O que é o Luto?

Para Freud (1916) “luto é a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um ente querido, como o país, a liberdade, o ideal de alguém e assim por diante”.
Neste breve estudo vamos nos ater à perda de um ente querido. Ressaltando a princípio que o luto é um processo que se inicia com a perda propriamente dita e se desenrola até o período de sua elaboração – quando o indivíduo enlutado volta-se, novamente, ao mundo externo após ter passado algum período voltando sua energia aos processos internos de elaboração.
Para a Psicanálise, o luto, desde que seja superado, não é considerado uma condição patológica, mesmo que traga consigo mudanças temporárias no estilo de vida de quem o vivencia, tal como a perda de interesse por atividades do cotidiano e pelo convívio social.

Como identificar o processo de enlutamento?

Cada indivíduo reage ao luto de forma distinta, variando de acordo com sua estrutura emocional, vivências e capacidade para lidar com perdas. É fundamental que esse processo de enlutamento seja vivenciado até que ele seja superado para que a dor da perda não fique reprimida e se manifeste posteriormente como algum outro sintoma. Tal processo se dá de forma lenta e gradual com período de duração variável para cada pessoa.
O processo de enlutamento é, normalmente, vivenciado através de um ou mais sintomas abaixo:
  • Entorpecimento - O indivíduo recentemente enlutado sente-se descrente, em choque, atordoado, desamparado. Isso acontece devido à dificuldade em aceitar a perda.
  • Negação – Se apresenta como mecanismo de defesa frente a essa situação tão dolorosa.
  • Anseios - Crises intensas de choro e Dor profunda – A perda pode gerar um grande anseio por reencontrar a pessoa morta. A impossibilidade desse reencontro pode gerar crises intensas de choro e dor profunda, assim como uma preocupação excessiva com seus pertences e objetos que tornem sua lembrança viva.
  • Culpa – Em muitos casos, esse sentimento é bastante presente. O enlutado pode, ao relembrar alguns eventos vivenciados com a pessoa morta, achar que deveria ter agido de forma diferente nessas ocasiões, ou, até mesmo, que poderia ter evitado sua morte.
  • Raiva, desespero, falta de prazer e hostilidade - Muitas vezes, o enlutado se volta contra amigos, familiares, médicos, Deus e, quando há o sentimento de culpa, contra si mesmo. Ele pode vir a se afastar dos amigos e do convívio social assim como perder o prazer e interesse no mundo externo, tanto em atividades novas quanto costumeiras.

Como superar o Luto?

A superação do luto se inicia quando o enlutado passa a construir um novo tipo de vínculo com a pessoa morta, fazendo com que a relação seja preservada em outro patamar. Nesses casos, o indivíduo falecido pode passar a ser internalizado, continuando, assim, a viver no mundo interno do enlutado.O sofrimento passa a ser menos intenso, e o sujeito enlutado passa, no geral, a buscar resgatar laços sociais, retomando vínculos antigos e construindo novas relações.
Podem ocorrer recaídas, principalmente em datas que lembrem o indivíduo falecido, como aniversários de nascimento ou de morte. Nesses casos, o apoio e a compreensão, tanto dos amigos quanto dos familiares, ajudarão a fazer do processo de enlutamento algo mais suportável.
Com o tempo, o enlutado volta a se inserir no mundo externo de modo pleno e, normalmente, com sua capacidade de suportar perdas aumentada, amadurecida.

Estudiosos investigam psicologia associada a morte, luto e superação

Publicado em ComportamentoUSP Online Destaque por Denis Pacheco 


Luto pode se converter em sentimento coletivo quando muitas vidas são afetadas em uma tragédia | Foto: Marcos Santos / USP Imagens
É atribuída ao francês Gustave Flaubert, autor do romance “Madame Bovary”, a máxima de que a morte pode ter mais segredos para nos revelar do que a vida. É com o foco neste pensamento que os pesquisadores do Laboratório de Estudos sobre a Morte, do Instituto de Psicologia (IP) da USP, investigam o imaginário no entorno daquela que é considerada a única certeza da existência.
À frente do LEM está a professora Maria Júlia Kovács, que coordena o laboratório e cuja formação no campo da psicologia está centrada em torno da morte desde sua dissertação de mestrado, defendida em 1985 na Universidade de São Paulo. “Fundamos o LEM em 2000, mas já realizávamos projetos e trabalhos em hospitais com profissionais de saúde”, conta Maria Júlia. “O interesse pelo tema começou como questão pessoal e se transformou em objeto de estudo. Temos disciplinas na graduação e na pós, além de ministrarmos cursos conforme pedido de instituições de saúde e educação”.
Dentre os objetivos do LEM, a professora destaca além dos estudos essenciais sobre atitudes frente à morte e ao luto no ocidente, como se dá a visão da morte em diferentes contextos e em diferentes fases do desenvolvimento. Além disso, o Laboratório também se propõe a expandir os horizontes do tema na formação dos profissionais de saúde e educação. Lidar com o luto é, além de uma prática que deve ser desenvolvida pelos que atuam nessas áreas, mas também uma ramificação do objeto central de estudos do grupo.
Podendo afetar não apenas o indivíduo, mas a sociedade como um todo, o luto é foco de constante investigação por parte dos membros do Laboratório. Neste ano de 2013, o Brasil passa coletivamente pela experiência traumática. O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, região central do Rio Grande do Sul, deixou 238 mortos na madrugada do dia 27 de janeiro, provocando comoção nacional.
“Uma situação como a que ocorreu em Santa Maria nos ensina muita coisa, infelizmente de uma maneira que é muito contundente e dolorosa”, reflete a professora. “O luto é das famílias que perderam seus filhos, dos amigos que perderam amigos e dos namorados que perderam seus amores queridos. [Mas também] É um luto coletivo porque foram muitos os mortos no mesmo evento. Temos que aprender como cuidar dos sobreviventes e como atuar em tragédias como esta”, revela ao remeter a um dos principais objetivos do LEM, que é o de promover o preparo dos profissionais e familiares que irão lidar com diretamente com as consequências de tragédias.

Falando de Morte

Criado em 1997, o projeto “Falando de Morte” consiste numa série de DVDs criados especificamente para facilitar a comunicação sobre o tema da morte. Segmentados inicialmente para faixas etária distintas, os filmes tinham como principal objetivo desmistificar a morte.
Foto: Wikimedia
Para as crianças, mostrando as pequenas perdas, a morte de um bichinho de estimação, a morte de uma pessoa querida e a morte de si mesma. Para os adolescentes, trabalhar os sentimentos que surgem da perda assim como a própria perplexidade diante da morte. E finalmente, para os idosos, o vídeo tinha com missão debater os sentimentos que envolvem o ser humano diante da velhice assim como apontar caminhos que facilitam as relações entre o idoso e a sociedade.
Após estas bem sucedidas empreitadas, um quarto filme foi lançado destinando-se aos profissionais que cuidam do sofrimento alheio, mas não têm espaço para cuidar da sua própria dor. “Em 2012 lançamos – Falando De Morte Na Escola – (os vídeos) foram criados com a proposta de sensibilização e facilitação da comunicação sobre o tema da morte. Eles pretendem, ser um disparador de discussões e não a palavra final, nem receitas sobre como abordar o tema”, esclarece Maria Júlia.

Colaboração

Para os estudantes que tem interesse no tema, o LEM oferece diversas oportunidades para aproximação. “Os alunos podem participar do LEM pelas disciplinas de graduação, pós, iniciação científica ou pelos eventos que organizamos”, conta a professora. “Temos tido uma procura significativa dos alunos”, destaca.
Programada para maio de 2013, a Jornada do Laboratório de Estudos sobre a Morte tratará do tema “Suicídio”. Com o objetivo de atrair pesquisadores e interessados em debater o assunto polêmico, o tema foi escolhido por permear discussões nas mais diversas áreas do conhecimento, assim como nas esferas legais e, principalmente, no íntimo de cada um de nós.
Cientes de que não poderão desvendar os enigmas que cercam o que acontece após o encerramento de uma vida, os estudiosos do LEM travam pequenas, mas significativas batalhas com o objetivo de compreender a dor e as ramificações dos vivos diante da morte inescapável.
Mais informações: site http://www.lemipusp.com.br, email lem@usp.br ou mjkoarag@usp.br, com a professora Maria Júlia Kovács